terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Carta


Lembro como se fosse hoje, o dia em que te conheci, era tão lindo seu sorriso, seus cabelos cor de mel, os cachos definidos, adorei quando perdi minha mão neles, seus olhos brilhavam, sua pele tão macia e clarinha, comparada a de um bebe, seu narizinho arrebitado, impunha-se a qualquer situação, sua estatura era baixa, pelo menos mais baixa que eu. Parecia uma boneca. Jamais poderia a esquecer.

Era apenas um menino, que acordava com o propósito de ir soltar pipa na rua, nunca pensei que aquele dia pudesse me fazer sentir algo que me reflete hoje.

Quando descobri seu nome, me encantei. Não cansava de repeti-lo todo instante, Sofia.

Acho que foi amor a primeira vista, na época nem sabia o que sentia, se era certo tudo aquilo, mas me apaixonei pelo seu encanto.

Me lembro que um dia trouxe uma amiga em sua casa pra brincar, e por algum acaso, você se machucou, eu a olhava chorar de longe, me dava um aperto no peito, queria tanto te ajudar. Não sabia o que estava acontecendo.

Crescemos juntos, freqüentando a vizinhança, já era comum você vir aqui em casa, passar o dia todo aqui. Lembro das barracas que montávamos no jardim, de quantos pegas – pegas que eu perdi. Você era ágil, esperta e claro inocente como uma criança.

Me tornei seu melhor amigo, se duvida você era destinada a ser a minha, entramos na adolescência, foi um baque o dia que me contou que beijou o Pedro, perdi o chão. A única coisa que consegui perguntar foi, “e ai?” não estava esperando resposta pior que essa “estou apaixonada por ele”. Aquele dia minha noite não existiu, pensei em você o resto do mês que quis me afastar. Depois desse mês que nada se resolveu, não te esqueci. Você me encontrou na rua, disse que estava namorando. E realmente vi em seus olhos, que estava feliz, você me mostrou aquele meio sorriso quando algo bom te acontece. Percebi que era hora de deixar você ir, falei “que bom que esta feliz Sofia, parabéns”. Depois desse dia resolvi esconder meu sentimento, deixei ele existir, mas o guardei. Apareceram meninas na minha vida, mas não conseguia as enganar, beijava uma aqui, a outra ali, mas não conseguia gostar realmente de ninguém quanto de ti. Passaram alguns anos, você permaneceu fiel a ele, ele fiquei sabendo que tinha te feito chorar, mas mesmo assim, o amor era grande. Chegou a época do vestibular, me mudei de cidade, minha família foi junto. Nada mais me prendia aqui.

Passei dez anos fora, perdi meus amigos, perdi minha melhor amiga.

Hoje sou um advogado bem sucedido, tenho uma casa linda, uma família perfeita.

Mas ainda sinto suas lembranças. Posso fechar os olhos, e ver seus olhos brilharem.

Resolvi voltar para minha cidade natal, ver se acho alguém, algum amigo.

Encontrei com a Olívia, ela me contou qual foi o seu destino.

Você continuou com ele, fez uma faculdade particular por aqui, ele não, estudou fora, conheceu gente, te traiu muitas vezes, mas depois da segunda você não se importava mais, tinha se acostumado, você o amava. Ele se tornou dependente químico, por algum problema quando se casaram não puderam ter filhos, a relatos dos visinhos que ele te batia todos os dias, você agüentava quieta, afinal, o amava. Dizem que na ultima briga, ele tirou do bolso uma faca, te acertou perto do peito, nas costas. Já era de madrugada, não se escutava choro, dor. Estava um perfeito silencio. No dia seguinte a encontraram morta, em um dos cômodos da casa. Escrevo essa carta chorando, se soubesse que ia acontecer isso com você, quem sabe não perderia o respeito, e falaria que te amo.

Agora estou indo no seu velório, vou por essa carta em suas mão, quero que leve com você , esse amor, quero enterrá-lo junto a ti. Junto ao que ontem me tiraram. Você.

3 comentários:

Tem um choro de colo que é guardado, todo seu. Um pedido, perdido, desculpa esquecida, arrependimento acomodado, lavado de choro, empurra...